Arrozal

quando sussurrarem ao pé do ouvido:
morreu a tua mãe – que farei?
eu que sou Borges menos que Borges
que farei quando os olhos embaçarem?
quando andorinhas trouxerem
a última carta o último beijo
o último Deus o abençoe, meu filho
– que farei?
quando o sol partir para sítios ignotos
quando não restar linha
para remendar montanhas
quando escapar das mãos
o fio que tece o interlúdio
quando vier a seca
quando vier a fome
quando findar a chama
que cinge a lamparina
– que farei?

como um pássaro que não sucumbe
ao olhar iracundo do espantalho
volta-
rei ao arrozal
roça-
rei ervas daninhas

cuida-
rei da terra



Arrozal | Poema do livro Memorial dos meninos | Rudinei Borges | 2014